Leonardo Wexell Severo, de Puerto Cortés-Honduras
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Marwin Gomez, líder dos trabalhadores de Puerto Cortés |
Às
vésperas do processo eleitoral que elegerá no dia 24 de novembro o futuro
presidente de Honduras, os 128 deputados ao Congresso e as 298
administrações municipais, o governo de Porfírio Lobo usa e abusa dos grandes
conglomerados de comunicação para acelerar a desnacionalização da economia.
Aplicando o receituário ditado pelo FMI e pelo Banco Mundial, os neoliberais
estruturaram uma empresa, a Comissão da Aliança Pública e Privada
(Coalianza), para gerir a “concessão” de rodovias, portos e aeroportos – entre
outros valiosos bens - aos estrangeiros. No caso de Porto Cortés, por onde
passam 95% das exportações e importações hondurenhas, Coalianza “licitou” o
terminal de contêineres e de carga, entregando no dia 1º de fevereiro, por três
décadas, seu filé para a International Container Terminal Services Incorporated
(ICTSI). De acordo com Marwin Alberto Gomez, presidente do Sindicato dos
Trabalhadores da Empresa Nacional Portuária, “não há nenhum sentido em repassar
ao capital estrangeiro a parte mais lucrativa de Porto Cortés, que responde por
cerca de 80% das entradas, pois isso inviabilizaria o Estado”. “Essa medida
entreguista, potencializada por uma ampla campanha midiática”, alertou Marwin,
busca se antecipar à virtual eleição da oposicionista Xiomara Castro de Zelaya,
do Partido Livre (Liberdade e Refundação) e esposa do ex-presidente Manuel
Zelaya - sequestrado e deposto em 2009 por um golpe armado pelos EUA - favorita
em todas as pesquisas de intenção de voto. “O governovendeu a ideia, através
dos meios de comunicação, de que a privatização era uma solução para
modernizar, para impulsionar e levar adiante a empresa nacional
portuária. Tivemos encontros com os companheiros do Partido Livre, onde reiteramos
a necessidade de pôr fim à privatização. Esse é um processo completamente
viciado, contrário ao interesse nacional. Se houvesse Justiça em Honduras, ele
já estaria anulado”, enfatizou o líder portuário. Desde o golpe contra Zelaya –
que ficou exilado na embaixada brasileira na capital, Tegucigalpa - a oposição
nacionalista expressa pela imprensa alternativa foi confrontada à bala pelo
governo, o que deixou um saldo de 26 jornalistas assassinados. Abaixo, a
íntegra da entrevista feita com Marwin no alto da torre de observação do Porto.
Que estava com o elevador danificado.
Viajando por
Honduras, no giro pelas ruas de Tegucigalpa, San Pedro Sula e agora Porto
Cortés, pudemos ver uma intensa campanha em favor do candidato oficialista, o
atual presidente do Congresso, Juan Orlando Hernandez, e da privatização. Há
uma batalha política e ideológica muito latente, que se acentua com a
proximidade das eleições do próximo dia 24. Como liderança sindical, qual a sua
avaliação?
O governo vendeu a
ideia, através dos meios de comunicação, que a privatização era uma solução
para modernizar, para impulsionar e levar adiante a empresa nacional portuária.
Desconsiderou que o Sindicato havia proposto um plano de desenvolvimento para o
porto, financiado através da emissão de bônus por meio da qual a empresa ia
modernizar suas instalações e, ao mesmo tempo, gerar os recursos necessários
para pagar esses empréstimos. Às vésperas da eleição o governo usou a mídia
para acelerar a privatização. É uma medida entreguista potencializada por uma
ampla campanha midiática. Não há nenhum sentido em repassar ao capital
estrangeiro a parte mais lucrativa de Porto Cortés, que responde por cerca de
80% das entradas, pois isso inviabilizaria o Estado.
Todas as pesquisas
neste momento apontam para uma vitória da candidata oposicionista, Xiomara
Castro de Zelaya, do Partido Livre, que tem se posicionado em defesa da
soberania nacional. As privatizações/concessões a toque de caixa refletem o
desespero dos neoliberais?
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Leonardo Severo com sindicalistas hondurenhos |
Tivemos encontros
com os companheiros do Partido Livre, onde reiteramos a necessidade de pôr fim
à privatização pois entendemos que esse é um processo completamente viciado,
contrário ao interesse nacional. Na verdade, se houvesse Justiça em Honduras,
esse processo entreguista já estaria anulado pelos tribunais.
Como está a luta
contra a privatização de Porto Cortés?
Porto Cortés é a
porta de entrada e saída do país, responde por 95% das nossas importações e
exportações, o que faz dele o porto mais importante de Honduras e um dos mais
estratégicos da América Central. É a porta de Honduras para o mundo,
trabalhando 24 horas por dia, sete dias por semana. O seu tipo de baía,
natural, abrigada, protegida pelas cordilheiras, lhe garante um mar calmo. Não
temos problemas de maré e de nenhuma índole, mantendo estável o calado, a
profundidade da baía. Estamos mobilizados em defesa de um patrimônio que é de
todos os hondurenhos.
A economia
hondurenha depende diretamente do tráfico marítimo que passa por
Porto Cortés. Por que privatizar?
É esta pergunta,
este questionamento que estamos fazendo nós trabalhadores e toda a população.
Por que privatizar Porto Cortés se ao longo da sua história de 48 anos ele tem
sido uma das empresas estatais mais rentáveis, contribuindo para a economia,
ajudando a todos os governos de plantão. Hoje é uma joia preciosa para a onda
de privatizações impulsionada pelo presidente Lobo. Ao contrário da
privatização, defendemos um plano estratégico para desenvolver a sua estrutura,
para acelerar o desenvolvimento do país, porque nos encontramos no porto que
abre as portas do mundo a Honduras.
Tentam entregar o
filé e deixar o Estado com o osso. Qual o papel da Coalianza nisso tudo?
Quero fazer uma
pequena introdução. Essa empresa portuária gera 1,6 bilhão de lempiras ao ano
[cerca de 80 milhões de dólares]. Destes, dá ao governo cerca de 400/500
milhões de lempiras [de 20 a
25 milhões de dólares]. Falar de Coalianza é algo preocupante para os
trabalhadores, porque o que ela veio fazer é praticamente entregar as empresas
rentáveis do Estado. Criaram uma associação pública-privada com o único
objetivo de entregar as empresas lucrativas, as que não necessitam de
investimento. Por isso tais parcerias têm vindo para empobrecer cada vez mais a
economia do país, esvaziando o estado.
A privatização tem
seus derivativos: terceirização, arrocho e precarização. Como o Sindicato tem
enfrentado esta lógica perniciosa e regressiva?
Denunciei o processo
de privatização e de corrupção, mas como o Ministério Público está praticamente
corrompido, a favor do governo, foi interposto um processo legal contra mim.
Uma chantagem jurídica para que retirássemos a denúncia. Assim, tenho proibições
até de sair do país. Querem calar a boca de quem denuncia para manter a
ilegalidade impune. Além da ação na Justiça e das articulações políticas para
barrar a privatização, temos nos movimentado bastante. Nosso Sindicato está se
transformando para fortalecer sua organização a fim de beneficiar o conjunto
dos trabalhadores do setor. Para nós é fundamental investirmos na autorreforma
sindical. Nossa concepção é de que precisamos evoluir de um Sindicato de base,
representativo somente de um setor, de uma categoria profissional, para
convertê-lo numa entidade de todos os trabalhadores dos transportes, seja
marítimo, aéreo ou rodoviário, a nível nacional. Isso ampliará o nosso poder de
fogo, nos dará mais capacidade para defender o interesse dos trabalhadores. Com
um Sindicato forte, teremos a maior quantidade de direitos possível.
Há muita gente ainda
no porto literalmente “a ver navios” em relação aos direitos sociais e
trabalhistas.
No setor portuário
há aproximadamente três mil trabalhadores, muitos que entregaram toda sua vida
ao porto, mas que nunca receberam o que é seu de direito. Agora passarão a ter
compensações sociais, seguridade social, benefícios médicos e
econômicos. Estamos empenhados para que quando haja uma nova fonte
de emprego no setor portuário, em primeiro lugar se busque as entidades dos
trabalhadores. Em segundo lugar queremos garantir a proteção desses
companheiros e para isso é preciso que sejam representados por uma organização,
para que não cheguem em desvantagem frente aos novos empregadores. Em terceiro
lugar queremos a vigência do movimento organizado. Isso é essencial para
enfrentar os novos desafios que, no caso de Honduras, se chama privatização.