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terça-feira, 15 de outubro de 2013

Juan Barahona: “Privatizações e concessões são câncer neoliberal a ser extirpado em Honduras”

Leonardo Wexell Severo, de Tegucigalpa – Honduras

Ao lado do líder da resistência hondurenha, Juan Barahona
Presidente da Federação Unitária dos Trabalhadores de Honduras (FUTH) e candidato a vice-presidente pelo Partido Liberdade e Refundação (Livre), Juan Barahona defende o fortalecimento do papel do Estado como “essencial para a nação e para a integração da região”, assim como é “a afirmação da garantia de direitos dos trabalhadores para a ruptura com a lógica neocolonial”. A mobilização por uma Assembleia Nacional Constituinte, acredita, é chave para garantir a realização das reformas estruturais, redistribuindo poder e riqueza. “Estamos convictos de que, hoje, nosso partido tem todo o respaldo do povo hondurenho em sua luta para construir a pátria livre e independente. Somamos a experiência da unidade e da organização popular com a consciência da justiça das nossas aspirações”, sublinhou. Barahona liderou a Frente Nacional de Resistência Popular (FNRP) contra o golpe promovido pela oligarquia e pelos Estados Unidos que depôs o presidente Manuel Zelaya em 2009. Atualmente integra a chapa de Xiomara Castro de Zelaya, combatente nacionalista, anti-imperialista e esposa do líder, favoritíssima em todas as pesquisas para as eleições de 24 de novembro.

Quais são os principais obstáculos à construção da democracia em Honduras neste momento?

No dia 28 de junho de 2009, quando ocorreu o golpe contra o presidente Manuel Zelaya e a Constituição, se rompeu com toda a ordem democrática em nosso país. Hoje todas as estruturas do Estado estão submetidas em Honduras à lógica golpista, antidemocrática, entreguista. Para aprofundar a democracia, dando efetivo poder ao povo, defendemos a realização de uma Assembleia Nacional Constituinte.

A vitória nas eleições do próximo dia 24 de novembro consolidará esse caminho?

Nós, através do Partido Liberdade e Refundação (Livre), por meio do qual estamos participando pela primeira vez do processo eleitoral, temos como uma das principais propostas a convocatória da Constituinte, que está sendo aceita e defendida pelo povo hondurenho. 75% da população apoiam a sua realização. Isso demonstra que o povo entendeu a necessidade de romper com a brutal concentração de poder e riqueza nas mãos da oligarquia vende pátria e vê na Assembleia Nacional Constituinte um instrumento para a mudança.

A mobilização eleitoral como meio para a realização de reformas estruturais...

O Partido Livre, através da candidata Xiomara Castro, está propondo a refundação do Estado de Honduras, que inicia com a Constituinte, para fazermos as mudanças estruturais. Do contrário, seria apenas um verniz, uma enganação como tem sido feita pelos governos neoliberais.

E qual o papel do Estado neste novo ordenamento?

O principal opositor à construção da democracia em nosso país é o próprio Estado, com o atual governo, que responde aos interesses oligarcas, contaminado pelos abusos e violações aos direitos humanos. A partir do Estado se reproduz, com a polícia e o exército, a imposição e a repressão para manter essa calamitosa e injusta situação política e econômica. Depois do golpe, temos a impunidade institucionalizada, um alto nível de criminalidade e delinquência, de pobreza, miséria e corrupção. Estas têm sido as marcas deste governo. Aqui foram detidos ministros da Fazenda com milhão de lempiras (moeda local) e nada ocorreu. Dinheiro comprovadamente roubado dos cofres públicos.

Fruto podre do golpe, a impunidade é total.

Exato. Por isso essa gente circula como se nada tivesse acontecido, é como se fossem empresários honoráveis, ministros honestos. A corrupção tem sido a linha mestra, a prática cotidiana deste governo. A situação é mais do que delicada, porque não há emprego, não há dinheiro circulando. O que temos é miséria e fome em abundância.

Há estudos que apontam que mais de um terço da população está desempregada.

O fato é que o desemprego disparou após o golpe, pois não só muitas empresas privadas fecharam, como também foram reduzidos os postos de trabalho nas empresas públicas. Como as políticas neoliberais têm sido sempre de redução do Estado, e o golpe aprofundou essa tragédia, temos um Estado ainda mais reduzido.

Como se deu esse processo de enxugamento do Estado?

Tivemos privatização, venda de empresas, venda de serviços públicos, concessões de rodovias, portos, aeroportos. Dentro do próprio governo formaram uma empresa chamada Coalianza, que está absorvendo tudo o que era do Estado.  O próprio presidente do Congresso, Juan Orlando Hernandez, que é o candidato à presidência pelo oficialismo, foi quem criou essa empresa privada, que fica com tudo o que é concessionado, privatizado. Uma estrutura de funcionários do governo para ficar com o que é do povo. É um estado dentro de outro estado, mas privado. Coalianza é um câncer que precisa ser extirpado, este é o nosso compromisso. O fortalecimento do papel do Estado é essencial para a nação e para a integração da região.

O golpe abriu caminho para o assalto ao Estado via “concessões”, levando o filé e deixando o povo com o osso.

O que dizer de concessões que nunca regressam ao Estado, como as rodovias? As concessões não são mais do que vendas, são apenas um disfarce, um grande negócio. Assim se concessionou uma parte do porto principal de Honduras, o porto Cortez.  Aqui as transnacionais estão explorando minas a céu aberto, preciosos recursos minerais, tirando de tudo. E ninguém sabe o que nem quanto levam: ouro, prata, cobre, zinco. É o velho pensamento colonizado sendo praticado contra o interesse nacional.

Golpismo e neocolonialismo, tudo a ver.

Aqui se produz matéria-prima em abundância que segue ao exterior sem agregar valor, de forma bruta. Defendemos que é preciso industrializar os nossos produtos, investir no conhecimento, na qualificação. Outro ponto que consideramos chave para a superação desse modelo dependente é o investimento no processo agrário, industrializando o produto no campo. Temos várias experiências positivas nesse sentido, com os camponeses beneficiados pela reforma agrária, mas que fracassaram posteriormente devido às políticas neoliberais. Os golpistas começaram a aprovar leis de “modernização” que beneficiaram unicamente os latifundiários, forçando os agricultores a venderem suas terras. Tínhamos cooperativas com muito boa produção de azeite de palma, que foram obrigadas a se desfazer de seus empreendimentos, que exportavam com qualidade, mas se viram inviabilizadas para serem entregues a multinacionais. A Empresa Associativa Camponesa de Isletas, nossa melhor experiência na exportação de bananas, uma referência de produção coletiva para a América Latina, com seus mais de mil associados, foi vendida a Standard Fruit Company, dos Estados Unidos.

Todo esse processo privatista foi antecedido por uma campanha midiática contra o Estado.

Começaram a vender empresas, a privatizar tudo o que foi um dia do Estado. Para isso se fez simultaneamente uma campanha contra o próprio Estado. Vendiam a imagem de um Estado corrupto, mau administrador, para ir justificando a venda dos serviços que ficaram, posteriormente, mais caros e com pior qualidade. Foi com esse discurso de que o Estado não dispõe de recursos, e de que a iniciativa privada administra melhor, que começaram as concessões de portos, aeroportos e rodovias. O mesmo aconteceu com a produção de energia elétrica e com as telecomunicações. Vale lembrar que durante o governo do presidente Manuel Zelaya havia o plano de implantação de uma empresa estatal de telefonia celular para competir com as estrangeiras.

E como ficou a questão dos direitos dos trabalhadores?

No mesmo momento em que é implementado o modelo neoliberal, vão sendo reduzidas as possibilidades dos trabalhadores se organizarem e de negociarem contratos coletivos. Nas empresas onde há contratos coletivos, sejam privadas ou públicas, os direitos não se cumprem. Aqui o principal infrator das leis laborais é o próprio Estado. Organizar um Sindicato em Honduras nesse momento é difícil, às vezes até impossível. Negociar um contrato coletivo significa três, cinco, até seis anos. Os trabalhadores estão sendo fustigados permanentemente, há uma criminalização da luta social.

Como se dá esta criminalização?

Nós temos companheiros processados e encarcerados pelo simples fato de defenderem os direitos que estão inscritos no seu contrato coletivo, uma perseguição movida pelo Estado. Entre outros, esse é o caso dos companheiros do Sindicato da Universidade Nacional Autônoma. Em Honduras temos garantida por lei uma estabilidade para os dirigentes sindicais, que vai desde o momento em que são eleitos até seis meses depois. Isso já não vale nada. Temos o caso de uma empresa privada que demitiu não só a junta diretiva do Sindicato, como os trabalhadores que respaldavam a cobrança dos direitos. Quem destruiu o Sindicato Metalúrgico de Choluteca é hoje o gerente da Empresa Nacional de Energia Elétrica. Ele declarou aberta e impunemente: “Com Sindicatos linha dura eu não negocio”. E despediu a todos. Mais de 300 trabalhadores. Hoje a maior parte daqueles metalúrgicos está sob contrato temporário, à margem da contratação coletiva, com salário mínimo e direitos totalmente rebaixados.

Qual o primeiro passo para formar um Sindicato em Honduras?

De acordo com o Código de Trabalho, se organiza um Sindicato com 30 pessoas de uma mesma empresa, como mínimo, Se notifica o Ministério do Trabalho que, muitas vezes, ele próprio, nega a personalidade jurídica. Eu organizei o Sindicato em uma empresa chinesa, a Patuca 3, que está construindo uma represa para geração de energia elétrica e o Ministério negou. Embora tivéssemos ali mais de 500 trabalhadores. E quem negou agora é candidato ao Congresso Nacional pelo Partido Democrata Cristão. Vira um grande esquema para as empresas, porque o Sindicato só passa a existir depois que há uma notificação por parte da inspeção do Ministério do Trabalho. A partir daí, nenhum trabalhador pode ser despedido, deslocado ou desmembrado da empresa. O problema é que até aí muito dinheiro pode correr e muita coisa pode ocorrer.

Com tamanha corrupção e impunidade, o risco de fundar um Sindicato é evidente.

Claro, os trabalhadores têm que estar muito conscientes e determinados porque sabem o que lhes espera com esse governo. Há cerca de três anos organizamos aqui em Tegucigalpa o Sindicato de uma fábrica de doces. Uma vez que conseguimos a personalidade jurídica demitiram 55 trabalhadores, incluindo toda a direção. Toda. Agora estamos batalhando pela reintegração dos companheiros. Juridicamente o Sindicato existe, mas na prática...

Qual a proposta do Partido Livre para corrigir esses abusos?

Chegando ao poder, Livre deve respeitar os direitos adquiridos dos trabalhadores. O que significa isso? Deve fazer valer o que diz o Código do Trabalho, a contratação coletiva e as convenções assinadas com a Organização Internacional do Trabalho (OIT). Além disso, precisamos melhorar as condições dos trabalhadores, para que se ampliem as conquistas, valorizando o trabalho e distribuindo renda. O contrário disso seria mais do mesmo. Se Livre não faz isso, de nada adiantaria todo o sangue derramado, todos os mortos que tivemos.

Como essa questão da repressão impactou o movimento sindical e popular?

As pessoas ficaram naturalmente atemorizadas. Os trabalhadores têm medo, preferem ficar sobrevivendo com migalhas, mas alimentando os filhos, do que organizar-se e perderem o ganha-pão. Como aqui não há emprego, assim que aumenta o salário mínimo, por menor que seja o reajuste, o patrão chantageia o trabalhador para que abra mão. Este ano foram 300 lempiras de aumento, cerca de 15 dólares. O patrão diz: bom, com esse aumento, vou ter de demitir. Com a chantagem, pagam somente metade do reajuste.

Muitas empresas transnacionais se instalaram em Honduras para aproveitar os estímulos dados.

Aqui há empresas “chatarras”, de comida rápida, que é um segmento tomado por transnacionais. Por quê? Porque não pagam imposto. E por quê? Porque são consideradas empresas de turismo (risos). Em nenhuma destas empresas conseguimos organizar Sindicatos, nenhuma. Aproveitando-se disso, várias dessas empresas não pagam sequer o salário mínimo.

E a lei do trabalho temporário, aprovada pela direita?

Veio agravar os problemas. No setor de comida rápida os trabalhadores que eram permanentes foram demitidos e viraram contratados por hora. Agora só lhes pagam a hora que trabalham. E nada mais. Aqui quando começaram a aplicar o modelo neoliberal, tentaram também mudar o Código de Trabalho. Ele não foi reformado pela forte oposição das centrais sindicais. Com a lei do trabalho temporário, a lei se viu automaticamente reformulada. Perdemos o direito à organização, perdemos a estabilidade no emprego, o pré e o pós-natal, o décimo terceiro e o décimo quarto salários, os recursos acumulados para a aposentadoria por tempo de serviço. Essa lei dá direito ao patrão de assinar contratos por até uma hora. Eles dizem que a lei gerou milhares de empregos, mas esquecem de dizer: por uma hora. A um trabalhador como o de comida rápida que era permanente, hoje lhe dão um par de horas e chamam isso de emprego. São vários trabalhando por hora e recebendo, todos, menos do que recebia um.

Qual o papel dos meios de comunicação nesta batalha?

Aqui os meios de comunicação sempre foram, historicamente, propriedade dos oligarcas. É uma mídia que responde a esses interesses e continua respondendo. Em vez de informar o povo, sempre investiram na deformação, na manipulação, com base nos interesses deles. Com o golpe do Estado e depois dele, esses meios da oligarquia tiveram uma postura consequente com o que são. Primeiro, ignorando e negando o golpe. Agora, uma posição de defesa do golpe. Felizmente, surgiram meios alternativos que se opuseram, que condenaram o golpe e se colocaram ao lado do povo. Isso é o que tem aberto canais onde o povo possa se expressar.

Com a perspectiva de serem derrotados, como apontam todas as pesquisas, resta aos golpistas o caminho da fraude. Qual a importância da solidariedade e da fiscalização internacional para que o resultado das urnas seja respeitado?

Aqui há um ditado que diz que “as eleições gerais são no estilo Honduras”. Porque aqui quase sempre há havido fraude. O golpe de Estado foi uma resposta da oligarquia para não entregar o poder, para que não fossem realizadas mudanças em favor da população. Agora, novamente, a direita dá mostras de que não quer entregar o poder. E diante desta ausência de vontade de respeitar a democracia, deixam claro que querem se manter governando a qualquer custo. Diante da possibilidade de fraude, de desrespeito a eleições limpas e democráticas, mais do que necessário, torna-se indispensável a presença de observadores internacionais. Para que possam dar fé da transparência ou da falta de transparência do processo eleitoral. Estamos convictos de que, hoje, nosso partido tem todo o respaldo do povo hondurenho em sua luta para construir a pátria livre e independente. Somamos a experiência da unidade e da organização popular com a consciência da justiça das nossas aspirações.


terça-feira, 7 de maio de 2013

ICIA na América Latina



Luciano Wexell Severo*

Evo Morales, Rafael Correa e Hugo Chávez: unidade
ICIA é uma sigla que poderia sintetizar a atual ofensiva dos setores mais conservadores da sociedade sul-americana. Condensaria as bandeiras de “luta” da classe alta, historicamente privilegiada, contra os avanços progressistas e democratizantes promovidos principalmente pelos governos de Cristina Kirchner, Evo Morales, Rafael Correa e Hugo Chávez (agora Nicolás Maduro).

As bandeirinhas da ICIA (“inflação”, “corrupção”, “insegurança” e “autoritarismo”) formam o quadrado reacionário, oligárquico e até mesmo fascista que orienta os discursos e as ações de uma parcela das oposições da região. Chama a atenção que o grau de “sensibilidade” destas quatro variáveis tem uma forte relação com dois agentes principais: 1) os grandes conglomerados industriais, financeiros e comerciais, controlados exatamente pela classe alta e pelo capital estrangeiro, e 2) os meios de comunicação hegemônicos, que também estão sob o controle das elites locais e das transnacionais do setor.

Note-se que cada um destes dois agentes influi de maneira decisiva para a maior ou menor “gravidade” dos quatro problemas. Os primeiros, os grupos econômicos, na medida em que controlam grandes faixas de mercado, desempenham um papel crucial na determinação do preço final dos produtos. Além disso, por meio do açambarcamento e da especulação, podem gerar o desaparecimento, a escassez e o consequente aumento de preços. Essa foi a “receita para o caos”, que ajudou a derrubar o governo de Salvador Allende, no Chile, em 1973. A falta de produtos nas prateleiras dos supermercados e o encarecimento de bens básicos, tais como leite, açúcar, arroz e farinha, promoveram a insatisfação social e reduziram a popularidade do governo. É o que está se tramando, em diferentes graus, em países como Venezuela, Bolívia, Equador e Argentina.

Por outro lado, e de forma complementar, esses mesmos elementos desestabilizadores resistem aos controles públicos que tentam atuar contra suas posturas criminosas. Os grandes conglomerados acusam governos intervencionistas de “autoritários”, de seguidores de Adolf Hitler e Benito Mussolini. Arremetem contra a ação do Estado sobre as altas taxas de lucro, as taxas de juros, as taxas de câmbio, o acesso a dólares e a melhora das condições de vida dos trabalhadores. Seu argumento central é o suposto “livre mercado”, que na verdade é uma tela de proteção para a livre atuação de grupos econômicos poderosos.

O planejamento do governo é considerado uma “intervenção exagerada”, um retorno ao “populismo irresponsável” ou mesmo uma “ditadura castro-chavista-comunista”. São deprimentes a ignorância, o desconhecimento e a cultura do ódio presente nessas passeatas e panelaços de setores da oposição. Tudo faz lembrar às múmias chilenas que celebraram a chegada de Augusto Pinochet ao poder. Usam conceitos de forma primária, fazendo incompreensíveis saladas com termos desenterrados da Guerra Fria contra a “ameaça vermelha” e os “guerrilheiros marxistas”. O refrão é a ICIA.

Aqueles que trabalham um pouco melhor com os conceitos sugerem que a volta ao nacional-desenvolvimentismo dos anos trinta, quarenta e cinquenta do século passado é um erro grave. Ao invés disso, propõem ir ainda mais longe. Buscam o velho liberalismo que tão bem apresentou, há 250 anos, o mestre Adam Smith. Sabe-se que a abordagem de um mundo liberal, que um dia pode ter sido parte dos sonhos de homens honestos, desde David Ricardo tornou-se uma proposta malandra, uma teoria hipócrita para beneficiar apenas os maiores e mais fortes. O alemão Friedrich List percebeu e denunciou isso há 170 anos.

Ao mesmo tempo, os poderosos monopólios de desinformação e alienação em massa, controlados por duas ou três famílias em nossos países, também se tornaram caixas de ressonância da “corrupção” e da “insegurança”, supostamente surgidas com os novos governos. A campanha reacionária inclui a proposta de redução da maioridade penal como se fosse a grande solução para os problemas da criminalidade. Assim, “inflação-corrupção-insegurança-autoritarismo”, as quatro rodas da carroça opositora se convertem em “denúncias”, “provas” e “verdades”. Em ação orquestrada, se impõem a ICIA. Por isso, são os próprios meios de comunicação os autoritários e os que conspiram contra a liberdade de expressão. Autodenominam-se os defensores das liberdades individuais, os guardiões da justiça e dos direitos civis. Esses mesmos meios de comunicação são aqueles que nasceram, foram criados e se calaram durante as ditaduras militares. Os mesmos que festejaram a orgia neoliberal, promotora da corrupção, da privatização, da miséria e da insegurança.

Respondendo aos seus inconfessáveis interesses econômicos, denunciam a existência de uma “inflação galopante”, a “maior corrupção da história”, o “autoritarismo crescente” e a “insuportável insegurança”. É uma fórmula para o caos do século XXI, neta do casamento entre os monopólios bancários e industriais e os monopólios de mídia. É o que se vê, com diferentes nuances, principalmente na Argentina, na Venezuela, na Bolívia e no Equador. No Paraguai, há menos de um ano, houve um golpe de Estado respaldado pela grande mídia. No Brasil, vislumbrou-se de forma muito clara a campanha da imprensa golpista contra o ex-presidente Lula e lideranças do seu partido. As hesitações e crescentes concessões do governo de Dilma Rousseff para os grandes grupos econômicos nacionais e internacionais mantêm uma paz aparente, quebrada apenas pelos panfletos porta-vozes de Washington que circulam em nossas bancas.

Finalmente, é importante perguntar o quanto um governo pode controlar a inflação, a insegurança e a corrupção em economias tão concentradas e com níveis tão elevados de controle estrangeiro. Com especulação se gera inflação e, seguindo as receitas ortodoxas, se jogam as taxas de juros para cima, como forma de enriquecer o sistema financeiro. Com ações terroristas e conspirações, com playboys queimando pneus e motoqueiros armados, se aumenta a violência a níveis “intoleráveis”. Com shows de “denúncias” e bombardeios de TV, rádios, revistas e jornais se apresenta um clima de “corrupção generalizada” como “nunca antes”. E toda a ação interventora do Estado para enfrentar as reais causas da inflação (os monopólios privados), a corrupção e a insegurança (heranças do neoliberalismo) é taxada de autoritarismo.

Portanto, devemos nos perguntar até que ponto os níveis de medição das quatro variáveis respondem à influência dos meios de comunicação. E em que medida a percepção das pessoas sobre esses problemas pode estar sendo dirigida pelos monopólios de mídia. A resposta, a nosso ver, leva a uma conclusão: não há nenhuma maneira de avançar com os processos progressistas, populares e democratizantes, sem a implosão e o extermínio destes dois tipos de monopólios privados. Pois, embora a combinação desses quatro fatores, que chamamos ICIA, seja etérea, gasosa e teatral, sua insistente utilização tem imposto constrangimentos e gerado freios consideráveis aos processos de mudança propostos pelos novos governos.

A destruição destes monopólios privados -econômicos e dos meios de comunicação- é essencial e gera pavor nas elites e no capital estrangeiro. Por essa razão os seus defensores são tão críticos a qualquer tentativa de ampliar o controle do poder público, do Estado, sobre essas duas estruturas. Quanto mais cedo os governos progressistas tenham a consciência da gravidade dessa situação, e quanto antes adotem medidas democratizantes, maior a sua chance de êxito. Por outro lado, continuar financiando esses monopólios com enormes e crescentes quantidades de dinheiro público, além de crime, pode ser considerado um estúpido tiro no pé.

* Professor do curso de Economia, Integração e Desenvolvimento da Universidade Federal da Integração Latino-Americana (UNILA), Foz do Iguaçu, Brasil. luciano.severo @ unila.edu.br
E meu mano menor...