Pensatempo: Carolus Wimmer: “A Venezuela votará contra a integração norte-americana”

terça-feira, 2 de outubro de 2012

Carolus Wimmer: “A Venezuela votará contra a integração norte-americana”



Deputado eleito para o Parlamento Latino-Americano destaca compromisso do governo Chávez com os ideias de Bolívar. “Não queremos uma América para os americanos do Norte”, frisou

Por Leonardo Severo e Vanessa Silva, de Caracas-Venezuela     

Em entrevista à Rede ComunicaSul – Comunicação Colaborativa, o deputado Carolus Wimmer, um dos representantes eleitos pelo povo venezuelano para o Parlamento Latino-Americano (Parlatino), destaca o compromisso do governo Chávez com o aprofundamento da integração, em benefício dos nossos países e povos. Eleito pelo Partido Comunista da Venezuela (PCV), Wimmer denuncia as sabotagens e bloqueios movidos pelos Estados Unidos contra o país, defende a nova Lei Orgânica do Trabalho, que recuperou e ampliou direitos suprimidos pelo neoliberalismo, denunciou a ação criminosa dos monopólios de mídia e ressaltou a importância de um Parlatino atuante para a defesa de um projeto de desenvolvimento inclusivo e redistributivo das riquezas nacionais.

A direita na Venezuela tem atacado a opção ideológica do governo Chávez pela multipolaridade, enquanto defende uma aliança estratégica com os estadunidenses. Qual a sua percepção?
No governo Chávez houve um bloqueio tecnológico e científico dos Estados Unidos e da União Europeia contra a Venezuela. A multipolaridade e as novas alianças internacionais são também uma consequência deste bloqueio. Tínhamos aviões militares F-16 no solo, impossibilitados de voar por falta de peças de reposição, pois o governo dos Estados Unidos avaliava que eram peças estratégicas e que éramos um país inimigo. A Venezuela comprou da Espanha barcos para sua guarda costeira combater o narcotráfico, supostamente um dos principais eixos da política internacional dos EUA. O que fez o governo estadunidense? Inviabilizar a compra, que parte dos equipamentos dos barcos construídos nos estaleiros espanhóis tinha tecnologia que lhes pertencia. Então as dificuldades, imposições, sabotagens e bloqueios vêm por todos os lados por parte das políticas imperialista. Desta forma, acabaram naturalmente surgindo novos parceiros.

A presença dos EUA historicamente tem sido marcante em um país que importava tudo, pois não produzia nada. Há relatos de que até ovos vinham de Miami. Como é isso?
Sou um imigrante alemão que chegou nos anos 1970 na Venezuela. Naquele momento havia apenas três multinacionais de automóveis, todas elas norte-americanas: Cryshler, Ford e General Motors. Em 1971, a Volkswagen teve de deixar o país por pressão da embaixada dos EUA. Assim eram as coisas na Venezuela, tudo era para atender aos interesses estadunidenses, quando muito sobravam migalhas para os europeus. É isso que estaremos decidindo no próximo 7 de outubro: um projeto de integração latino-americano ou um projeto de integração norte-americano. Passados dois séculos, está bem viva a luta entre o latino-americanismo de Bolívar e o pan-americanismo da doutrina Monroe, da América para os americanos, do Norte. A vitória de Capriles colocaria em perigo o projeto desenvolvimentista e o rumo integracionista, pois ele revisaria todos os convênios e contratos em função dos interesses das grandes empresas dos EUA. Portanto, no próximo domingo, não está em jogo somente a Presidência da República da Venezuela, mas um projeto de desenvolvimento conjunto, que vem melhorando a qualidade de vida do continente.

No caso específico da Venezuela, há muitas iniciativas como a Lei Orgânica do Trabalho, que vão na contramão do receituário neoliberal imposto recentemente pela troika à Europa, de redução de salários e direitos. Em muitos países, como o Brasil, a direita defende a chamada “flexibilização” das relações de trabalho, argumentando que isso tornaria o país mais “competitivo”. Qual a sua avaliação da nova lei do trabalho?
Não é por vaidade, mas por justiça, que gostaria de lembrar que o projeto inicial da Lei Orgânica do Trabalho, os Trabalhadores e as Trabalhadoras, foi elaborado por um parlamentar do Partido Comunista da Venezuela (PCV), Oscar Figuera, que era então presidente da Comissão de Assuntos Trabalhistas do Congresso Nacional. Pela própria dinâmica da luta de classes, esta lei ficou engavetada durante muito tempo, até que o presidente Hugo Chávez Frias, com sensibilidade, a retirou da Assembleia e a colocou entre as Leis Habilitantes, que são de iniciativa presidencial. É uma lei que recupera direitos perdidos nos anos 1980 e 1990 com as privatizações, como os contratos coletivos, que foram substituídos por contratos temporários, sem nenhuma estabilidade, sem garantias. Que reduz a jornada de trabalho sem redução de salário.

É uma lei que recupera direitos e dá dignidade ao trabalhador.
A lei elimina os contratos temporários desde o primeiro dia, não há mais três meses de contrato de experiência, isso está eliminado. O trabalhador passou a ter direito desde o momento em que for contratado. Há também avanços estratégicos, como o reconhecimento dos Conselhos Socialistas de Trabalhadores e Trabalhadoras, que funciona como um poder operário, também nas empresas do Estado. Isso fortalece a democracia e contribui para uma maior formação política, ideológica, sindical e cultural da classe trabalhadora. Este ponto, em que pese estar colocado na lei orgânica, agora precisará de uma lei específica. Independente desta questão estar pendente, os trabalhadores pegaram a cópia da lei, no marco do processo revolucionário que estamos vivendo, e foram à luta de forma massiva, se adiantando à própria legislação. Algo assim só pode ocorrer num processo rico como o nosso. O debate nestes conselhos não é só o que a empresa produz, mas para que, como se emprega, para onde vai o lucro. Há um avanço, uma tomada de consciência, que é uma das características da democracia popular revolucionária que estamos vivendo.

Já há empresas onde estes conselhos estão atuando?
No Hotel Alba, que reúne 573 trabalhadores, no Canal 8 de Televisão, na Rádio Nacional da Venezuela, em várias estruturas públicas. É algo novo, impulsionado por Chávez, que vai além do sindicalismo que, naturalmente, deve cuidar da proteção dos direitos dos trabalhadores, de melhores acordos, de maiores salários. Mas aqui estamos falando de poder operário, da perspectiva democrática de superação do capitalismo, da construção de uma nova sociedade, de luta contra a exploração, de uma efetiva humanização das relações de trabalho.

Ao contrário do que a mídia privada veicula todos os dias em nosso país, pudemos ver na Venezuela uma total liberdade de imprensa, onde muitos meios chegam inclusive a agredir o presidente, ministros e parlamentares, sem qualquer compromisso com a objetividade ou com a própria realidade. O que fazer?
Quando houve o fechamento da RCTV, a oposição fez muitos protestos, rapidamente ecoados pelas agências internacionais no exterior. Agora, há muita expectativa de que quando se encerre o prazo de concessão da Globovisión, que é um apêndice da CNN e da CIA, ela não seja renovada. O fato é que o espaço radioelétrico pertence ao Estado venezuelano e que assim como há contratos para o aluguel de determinado imóvel, que vencem após determinado tempo e onde o morador precisa sair, que é a lógica do capitalismo que defendem, da mesma forma estes canais podem voltar ao Estado caso descumpram as regras. No caso venezuelano o que está ocorrendo é que eles violam abertamente a lei para provocar o seu fechamento. É algo criminoso. Querem que o governo adote medidas para fazer um escândalo internacional. Chávez tem agido com calma, driblando armadilhas e provocações.

Como tem sido a atuação do Parlatino?
O Parlatino está num momento de decisão, em que a esquerda progressista e anti-imperialista necessitará ficar mais atenta, atuar mais, coordenar ações. Com a criação da CELAC (Comunidade dos Estados Latino-Americanos e Caribenhos), com uma estrutura presidencial executiva, precisamos ter um parlamento ao seu lado, um legislativo para lhe dar suporte. Se funcionar a CELAC, como deve, eliminamos a OEA (Organização dos Estados Americanos), o que exigirá uma mudança na correlação de forças. Esta ação conjunta das forças progressistas terá um papel fundamental para o avanço da luta anti-imperialista em nosso Continente, afirmando cada vez mais uma visão integracionista, de solidariedade e de reciprocidade. Esta tem sido a nossa luta e o nosso compromisso na caminhada rumo ao socialismo.

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