Resolução do Diretório
Nacional do Partido Pátria Livre (PPL)
O Brasil, no momento, enfrenta
problemas graves em sua economia. Desde já é preciso ser claro que estes
problemas não são advindos da crise nos países imperialistas do norte da
América, da Europa - e, na Ásia, o Japão. Pelo contrário, até o FMI, em seu
último relatório, reafirmou a estimativa de que os países "emergentes e em
desenvolvimento" têm a perspectiva de crescer, em média, 5,6% este ano. Por
que o Brasil - para o qual se prevê atualmente menos de 2% de crescimento,
ou seja, menos que os pífios 2,7% do ano passado - depois de um consistente
crescimento de 7,5% no último ano do governo Lula - seria o único
substancialmente afetado pela crise dos países imperialistas? Hoje, através
dos jornais, há uma vasta gama de diagnósticos - e, sobretudo, de
perplexidades e palpites, via de regra algo alucinados - sobre os problemas
atuais do nosso país. No sentido de contribuir para a discussão, pela
importância do seu conteúdo, publicamos hoje a resolução da última reunião
do Diretório Nacional do Partido Pátria Livre (PPL), realizada no dia 3 de
junho. Intitulada "O País Precisa Voltar a Crescer 2" (uma referência à
resolução anterior, que tinha o mesmo título), é um documento de importância
decisiva nos dias atuais.
C.L.
I
O Diretório Nacional aprovou em 26 de fevereiro uma
Resolução com o título "O Brasil Precisa Voltar a Crescer", que por sua vez
se baseou na avaliação debatida na reunião de dezembro.
Naquela ocasião, não havia ainda sido divulgado o
resultado do PIB de 2011. Mas, diante da projeção feita pela Fiesp de um PIB
de 2,8%, e da conclusão do ministro Mantega de que esse seria um "bom
resultado" em função da "crise internacional", nosso esforço se
voltou para demonstrar os graves equívocos desse raciocínio.
Primeiro: A crise dos centros financeiros imperialistas,
iniciada em 2008, levou de roldão as economias dos EUA, Europa e Japão, mas
no resto do mundo, não só na China e na Índia, o quadro de 2011 foi de
franco crescimento. A média dos países da América do Sul, excetuando o
Brasil, ficou acima dos 6,5%. (1)
Segundo: O desabamento do PIB - de 7,5% em 2010, para
menos de 3% em 2011 - e a crise da nossa indústria se deveram à adoção de
uma política interna altamente recessiva, baseada na elevação dos juros
(acarretando a apreciação do câmbio), na fixação de um superavit primário
esmagador, nos cortes orçamentários, na redução do investimento público, na
contenção dos salários (para desaquecer o mercado interno) e na elevação do
nível de desnacionalização da economia.
É verdade que a taxa básica de juros (Selic), depois das
cinco altas sucessivas de 2011, já começara a recuar diante dos protestos
generalizados do movimento sindical e do empresariado nacional. Mas o fato é
que a luta e a discussão no interior da sociedade avançaram
significativamente, após a divulgação, em março, dos minguados 2,7% de
crescimento do PIB.
A tese da inevitabilidade de um crescimento pífio foi
bastante abalada, embora não esteja morta. E a nossa querida presidenta, que
pode mais do que Mantega e Tombini, tem afirmado insistentemente que as
taxas de juros no Brasil precisam convergir para os patamares
internacionais, que na média estão abaixo de 0%.
Com base nesta pressão, os juros têm recuado e o câmbio
melhorado. A taxa básica (real) está em 2,8% e o cambio na faixa dos R$ 2,00
- ambos ainda distantes do patamar da razoabilidade, mas não mais naquela
situação de câmbio a R$ 1,60.
II
É importante a percepção revelada pela presidente Dilma
de que as taxas de juros precisam cair ao nível das taxas internacionais,
porque para o Brasil voltar a crescer é mesmo indispensável reduzir as taxas
de juros – especialmente a taxa básica – e equilibrar o câmbio.
Mas isso não é tudo. Já é hora do governo concentrar a
atenção numa questão estratégica.
Desde 1995, o estoque de capital estrangeiro no Brasil
tem crescido numa velocidade extremamente mais rápida do que o estoque de
capital nacional.
Em 2010, o Investimento Estrangeiro Direto (IED) atingiu
US$ 579,6 bilhões. Entre 1995 e 2010, o estoque de capital fixo cresceu em
torno de 35%, enquanto a parcela estrangeira nesse total aumentou 1290%.(2)
Na prática, isso funciona assim: Entre os anos de 1995 e
2000, 1100 empresas privadas brasileiras foram compradas por
multinacionais.(3) Notem que não estamos mencionando as mais de 300 estatais
privatizadas, cuja maioria também foi adquirida por corporações americanas e
européias.
Entre 2004 e 2011, essa desnacionalização selvagem
atingiu 1074 empresas nacionais. Só no ano de 2011 foram 208 empresas. E o
resultado do primeiro trimestre de 2012 apresenta um crescimento de 117,65%
em relação ao primeiro trimestre do ano passado (4).
Um pequeno exemplo do tipo de consequência que isso
provoca pode ser verificado na tragédia do etanol. Em 2008 o Brasil
exportava 4,7 bilhões de litros, produzidos principalmente em usinas
nacionais, que foram pioneiras nessa atividade econômica. A produção cresceu
à razão de 10,4% ao ano, entre 2003 e 2008. A criação de novas usinas se
acelerava: 9 em 2005, 19 (2006), 25 (2007) e 30 (2008). Veio a "Strong
Consolidation", eufemismo para designar a ofensiva desnacionalizante
através da qual a Shell tomou a Cosan e a Nova América, a Britsh Petroleum
pegou a Companhia Nacional de Açúcar e Álcool e a Tropical Bioenergia, a
Bunge se apoderou da Moema, a Louis Dreyfus empalmou o Grupo Santelisa, o
Noble Group absorveu o Grupo Cerradinho, a Shree Renuka Sugars tomou posse
do grupo Equipav, a Tereos abiscoitou parte do Grupo Guarani, a Vertente e a
Mandu... O número de novas usinas foi declinando: 19 (2009), 10 (2010) e 5
(2011). Em 2011 as exportações foram 70% menores do que em 2008, e o Brasil
teve que amargar a importação de 1 bilhão e 100 milhões de litros de etanol
de milho dos EUA.(5)
Como é possível prosseguir desse jeito?
As multinacionais importam, em média, 290% a mais que as
empresas nacionais, porque preferem trazer de fora máquinas, equipamentos,
componentes e insumos. Assim, o estoque de capital externo, que já é mais
que excessivo nos setores chave da economia, vai tornando as importações e
as remessas de lucros insustentáveis para o país.
Para vencer esse gargalo e tirar nossa indústria do
estado de penúria em que se encontra é preciso mais do que reduzir os juros
e equilibrar o câmbio.
Não dá mais para o Brasil continuar sem política
industrial, sem política de substituição das importações, sem política para
desenvolver a engenharia nacional nos setores de tecnologia de ponta.
A proposta do PPL é resolver essas três questões, que na
verdade são faces distintas do mesmo problema, priorizando as empresas
genuinamente nacionais nos financiamentos e nas encomendas do Estado, tal
como recomendava a Constituição de 88, antes de ser mutilada por FHC. Sem
isso não haverá um verdadeiro crescimento sustentado.
E aqui não se trata de ser contra o capital externo, mas
de dar à empresa nacional a prioridade que ela merece.
A alegação de que o Brasil não dispõe de recursos
suficientes para promover o florescimento da uma indústria genuinamente
nacional, em todos os setores, é 100% falsa. Não fosse, o ministro da
Fazenda não teria precisado planejar, no início de 2011, a redução dos
financiamentos do BNDES - segundo o gênio, "para abrir espaço ao
investimento privado" . Não teria concordado em produzir,
deliberadamente, uma queda de 18% - 19% se levarmos em conta só a indústria
– nesses desembolsos. E, menos ainda, que os 82% restantes continuassem a
ser em grande parte destinados a multinacionais, que em tese estariam no
Brasil para suprir a nossa suposta falta de capitais.(6)
III
Aumentar o peso do setor nacional (estatal e privado) na
nossa economia é fundamental para que ela tenha saúde.
Ademais, é preciso sempre ter em mente que sem aumento
real de salário, emprego e investimento público não há economia que se
sustente. Atropelar esse princípio elementar que norteou o governo Lula
equivalerá sempre a caminhar para trás. (7)
Não é com desoneração dos impostos das multinacionais que
o Brasil retomará o caminho do crescimento. Os derrubadores do PIB
emplacaram em 2011 todo o arsenal de medidas recessivas de uma só vez. Dilma
terá que se livrar de todas, se quiser salvar o PIB de 2013, pois o de 2012
também já se encontra seriamente comprometido.
Dada a importância estratégica do movimento sindical
nessa batalha, o PPL não medirá esforços para estreitar os laços com as
Centrais Sindicais. Falamos de todas as que têm atuado unitariamente na
grande campanha pela redução dos juros e a redenção da nossa indústria. (8)
E, especialmente, da nossa corajosa Central Geral dos Trabalhadores do
Brasil, que, mesmo golpeada por uma traição interna das mais abjetas, não
arredou o pé da trincheira, reorganizou-se e deflagrou uma campanha de
filiação.
O PPL vai apoiar essa campanha como quem apóia um irmão.
Nossas mais de 700 Comissões Provisórias enraizadas em todos os Estados do
Brasil vão tomar para si o encargo de filiar pelo menos um sindicato à CGTB.
Convocamos todas as forças vivas da nação a desfraldarem
essa bandeira. Os maiores beneficiários do fortalecimento da CGTB serão o
movimento sindical como um todo, a unidade das Centrais e a luta nacional e
democrática.
IV
Como estamos às vésperas das eleições, acreditamos ser
essa uma oportunidade ímpar para difundirmos amplamente a síntese do nosso
programa partidário, do qual derivam não apenas nossas propostas para
solucionar os problemas nacionais, mas também os municipais.
Acrescentamos à síntese anterior um item específico sobre
a questão da Cultura. E ela ficou assim:
1. Ampliar o mercado interno, com aumento real de
salários e mais empregos.
2. Reduzir os juros, equilibrar o câmbio e promover o
desaperto orçamentário.
3. Concentrar os recursos do BNDES para financiar as
empresas nacionais e dar prioridade a elas nas encomendas do Estado.
4. Desenvolver a ciência, a engenharia nacional e os
setores de tecnologia de ponta vitais para a nossa independência -
especialmente a microeletrônica, informática, telecomunicações, engenharia
genética, energia nuclear, engenharia aeroespacial, materiais estratégicos e
a indústria da defesa.
5. Apoio do Estado às realizações dotadas de excelência e
relevância para o desenvolvimento da cultura nacional.
6. Educação e Saúde: pública, gratuita e de qualidade
para todos.
V
O Pátria Livre marchará unido nessas eleições municipais
com uma política clara de priorizar o lançamento de candidaturas próprias a
prefeito nas grandes cidades e as alianças eleitorais com as forças que
compõem a base de sustentação do governo Dilma.
Nosso objetivo primordial é levar o mais longe possível
as propostas do partido e encher as praças com o verde-amarelo das nossas
bandeiras. Queremos consolidar o partido e atrair novas forças. Queremos nos
converter rapidamente num grande partido de massas, à altura dos desafios
que o país enfrenta nessa fase final da luta para completar a sua
independência.
Para que o PPL seja de fato esse partido, para que não se
transforme numa sopa de interesses subalternos, não podemos descuidar em
nenhum momento da disciplina.
Nesse sentido, o Diretório Nacional reafirma a decisão da
reunião de 26 de fevereiro de que até a realização das convenções não haverá
membro de Diretório, Comissão Provisória e candidato que não esteja em dia
com as suas obrigações partidárias – nenhum membro do PPL que não preencha
esses requisitos estará apto a votar ou ser votado nessas convenções.
Acrescentamos também que a política eleitoral em cada município deverá ser
previamente aprovada pela respectiva Executiva Estadual, e, nas cidades
acima de 200 mil eleitores, pela Executiva Nacional.
No PPL não há questão que não possa ser debatida e
democraticamente decidida. Mas também não haverá deliberação geral que valha
para uns e não para outros.
Paralelamente à batalha eleitoral, é fundamental seguir
estimulando a rumorosa CPMI do Cachoeira a aprofundar as investigações sobre
os malfeitos.
As gravações da Polícia Federal revelam que as ações da
quadrilha iam muito além do enriquecimento ilícito e da lavagem de dinheiro.
Elas comprometem o ex-líder do Dem no Senado, a revista "Veja", uma grande
empresa da construção civil, o governador Marconi Perillo, um ministro do
STF e o procurador-geral da República - que mesmo sabendo fez questão de
tudo acobertar - numa série de ações de cunho conspirativo visando
desestabilizar o governo e promover o golpismo, para, no mínimo,
enfraquecê-lo e empurrá-lo para trás.
Tanto o governo Lula quanto o governo Dilma foram vítimas
dessas armações. É necessário que os responsáveis sejam expostos à execração
pública e não permaneçam impunes, para que a atuação de esquemas desse tipo
seja fortemente desestimulada, limpando o terreno para que o governo possa
avançar sem inibições e sobressaltos. Pois, mais do que nunca, o que ele
necessita é de tranquilidade para reavaliar o caminho percorrido, retornar à
estrada do crescimento e dar a volta por cima.
São Paulo, 3 de junho de 2012.
Notas
(1) Quem conhece um pouco da História do Brasil sabe
que os momentos de crise dos centros imperialistas sempre foram os mais
propícios para o país valorizar seu mercado interno, suas empresas, sua
tecnologia, seus trabalhadores e crescer aceleradamente.
Mas para quem insiste em desconsiderar a experiência das
gerações passadas não custa nada lançar um olhar sobre o estado atual do
mundo e ver que não há razão objetiva para o Brasil ter empacado.
Não vamos falar de China e Índia (nossos parceiros no
BRICS) que, não tendo tomado conhecimento da crise em 2008, 2009 e 2010,
cresceram em 2011 a uma taxa de 9,2% a primeira e 7,4% a segunda.
Vamos só apresentar uma singela relação de países de
vários continentes com as respectivas taxas de crescimento no ano de 2011,
algumas já confirmadas e outras baseadas nas previsões que figuram no último
relatório do FMI. E aqui cabe parênteses: o FMI, por um vício cuja origem já
se perdeu no tempo, costuma errar para cima nas previsões referentes aos
países mais afinados com suas políticas e para baixo em relação aos demais.
Eis os números: Argentina (9,2%); Uruguai (6%); Paraguai
(6,4%); Chile (6,2%); Equador (5,8%); Peru (6,6%); Bolívia (5%); Colômbia
(4,6%); Venezuela (4,2%); México (4,1%); Rússia (4,1%); Bielorrússia (5%);
Ucrânia (4,7%); Geórgia (5,5%); Uzbequistão (7,1%); Cazaquistão (6,5%);
Turquia (6,6%); Mongólia (11,5%); Sri Lanka (7%); Bangladesh (6,3%); Vietnam
(5,8%); Laos (8,3%); Camboja (6,7%); Indonésia (6,4%); Malásia (5,2%);
Filipinas (4,7%); Nigéria (6,9%); Moçambique (7,2%); Quênia (5,2%); Etiópia
(6,7%); Marrocos (4,6%); Zimbábue (6%); Tanzânia (6,1%); Zâmbia (6,7%);
Botswana (6,1%); República Democrática do Congo (6,5%).
Diante desse quadro, não é possível concordar com a nossa
presidente quando ela afirma, em entrevista coletiva na Bulgária
(05/10/2011), que o país não poderia estar "imune ao aprofundamento da
crise" dos big brothers.
Por que não poderia, se a média de crescimento da América
do Sul, sem o Brasil, ficou acima dos 6,5%? (O Brasil Precisa Voltar a
Crescer, Resolução do Diretório Nacional do PPL, 26 de fevereiro de 2012)
(2) "Estoque de Patrimônio nas Mãos de Estrangeiros É de
US$ 579 bi", Carlos Lopes em "Hora do Povo", 21/12/2011.
(3) Programa do Partido Pátria Livre, 21/04/2009.
(4) KPMG Consultoria (ver "Hora do Povo", edições de
25/04/2012 e 09/05/2012).
(5) "O Etanol Era Nosso", Carlos Lopes em "Hora do Povo",
13/01/2011
(6) "Financiamento do BNDES à indústria cai 19% em 2011",
Carlos Lopes em "Hora do Povo", 20/01/2012.
(7) O governo Lula fixou quatro pilares fundamentais
para que o Brasil pudesse singrar esses mares conturbados com segurança, sem
se deixar dominar pela lógica hegemônica, cínica e pervertida.
Política externa independente; recuperação dos empregos e
salários; crescimento com base no investimento público e na expansão do
mercado interno; fim das privatizações das empresas públicas - todos eles
premissas para a construção de um verdadeiro projeto
nacional-desenvolvimentista.
Faltava uma definição explícita sobre a prioridade para
as empresas nacionais (estatais e privadas) nos financiamentos e encomendas
do Estado, e um plano abrangente para desenvolver, com base no capital
nacional, os setores de tecnologia de ponta:..
O governo Dilma, em seu primeiro ano, não avançou no que
precisava e refluiu em boa parte do que já estava feito.
Congelou a Telebras e o projeto de universalização da
banda larga. Diluiu o conteúdo antiimperialista da política externa
independente numa sopa eclética de admoestações contra supostas ou reais
violações dos direitos humanos atribuídas pelos campeões mundiais da
modalidade, os EUA, a regimes que eles têm interesse em desestabilizar.
Adiou o aumento real do salário mínimo, arrochou os servidores, fez campanha
para conter o aumento real de salários em todas as categorias. Reduziu o
investimento público (os desembolsos do BNDES caíram 18% em relação a 2010),
paralisou obras, travou a elevação do orçamento da Saúde e da Educação.
Catapultou os juros com cinco altas sucessivas que desequilibraram o câmbio
e escancararam o país às importações, derrubando a indústria e o crescimento
econômico como um todo. De quebra, privatizou o controle de três aeroportos,
com a Infraero no estranho papel de pagar R$ 11,7 bilhões para isso. (O
Brasil Precisa Voltar a Crescer, Resolução do Diretório Nacional do PPL, 26
de fevereiro de 2012).
(8) "90 mil em São Paulo no Grito de Alerta pela Salvação da Indústria"
(ver "Hora do Povo", 06/04/2012).
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